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22 Agosto, 2022

Cátia Terrinca acusa município de Elvas de “iliteracia cultural” e leva UMCOLETIVO para Portalegre

Associação já está a trabalhar em Portalegre, desde julho passado e deixa sete anos de criação artística em Elvas.

A Associação Cultural, “UMCOLETIVO”, fundada em 2013 e que tem direção de Cátia Terrinca já passou a desenvolver a sua atividade artística na cidade de Portalegre.

É no Teatro da capital de distrito, que desde julho passado, os artistas que integram esta associação passaram a desenvolver os seus ensaios diários para a preparação da peça “Má Sorte”, que estreia esta semana no Festival Internacional de Teatro de Setúbal.

Por não ter existido entendimento com o município de Elvas, a UMCOLETIVO encontrou em Portalegre uma autarquia que lhe abriu portas e proporcionou condições para concretizar um trabalho “sério e profissional”, segundo a artista.

“Nós temos, neste momento, a cedência de um espaço por parte do município de Portalegre que nos permite trabalhar com outro rigor e outras condições, uma vez que é um Teatro e nós podemos lá trabalhar dentro daquilo que é a normalidade da prática teatral, com ensaios diários. Isso é uma cedência que nos permite um trabalho mais rigoroso, para além de termos apoio financeiro por parte do Centro de Artes e Espetáculos de Portalegre e estarmos a desenvolver parcerias com as escolas”, justificou Cátia Terrinca.

A artista que trouxe para Elvas alguns dos mais importantes projetos culturais dos últimos anos, não poupa nas críticas ao atual executivo camarário elvense, acusando-o de “iliteracia cultural” e “falta de profissionalismo”.

A UMCOLETIVO chegou a Elvas há cerca de sete anos, tendo criado o projeto “Casa Tangente” e o Festival Assalto – Tomada Artística da Cidade de Elvas, entre muitos outros, trazendo a Elvas dezenas de artistas e levando o nome de Elvas a todos os palcos nacionais e internacionais que pisou, desde então.

A UMCOLETIVO vem desenvolvendo parcerias com instituições de renome a nível nacional , como o Teatro Nacional D. Maria II, o Teatro São Luís, a RTP e a Antena 2.

De algum tempo a esta parte, vê-se na circunstância de não obter respostas por parte da autarquia de Elvas para a implementação dos seus projetos artísticos o que leva à insustentabilidade da sua permanência em Elvas, de acordo com Cátia Terrinca.

“Não temos condições para continuar”

“Neste momento, não temos condições para continuar, porque o dinheiro pode vir de vários sítios e as falhas financeiras podem ser colmatadas por outros projetos e outros apoios, subsídios e parceiros, mas há respostas das quais nós precisamos e só dependem do município”, esclareceu Cátia Terrinca.

A mesma responsável especifica o argumento e enumera: “aquilo a que se chama o apoio logístico, relação de confiança e franqueza que nós temos vindo a construir e construímos ao longo dos últimos sete anos, onde havia franqueza e havia, na minha perspetiva, a construção de um projeto cultural e artístico para a cidade, da qual nós fazíamos parte junto com outros interlocutores, com a AIAR com o Museu de Arte Contemporânea e com outras associações, neste momento, penso que essa relação de confiança está absolutamente quebrada”, referiu .

“Falta de profissionalismo com que o município de Elvas tem encarado o trabalho da cultura”

De acordo com a artista, o canal de comunicação com a Câmara não existe.

“O que antigamente eram contactos rápidos, através de e-mail, reuniões e/ou chamadas telefónicas que resolviam os problemas no terreno, neste momento é tudo muito moroso e deparamo-nos com um nível de iliteracia cultural bastante grande e que tem impossibilitado o normal progresso do trabalho e, como eu, enquanto cidadã e artista o que quero é crescer, entendo que os objetivos da associação (trabalho rigoroso, sustentado, corrigir as assimetrias graves que existem no acesso à cultural), não são compatíveis com a falta de profissionalismo com que o município de Elvas tem encarado o trabalho da cultura”.

No passado fim de semana, a UMCOLETIVO realizou uma versão mais curta do Festival A SALTO: SOBRESSALTO, como um pronúncio do fim de uma era cultural em Elvas.

“O A Salto morreu (…) recebemos mais de 300 artistas”

Festival A Salto 2018
fotografia por Susana Chicó

“Ainda que queiramos celebrar, precisamos de o fazer com a honestidade de quem conta uma história enviesada. O A Salto morreu, viva o A Salto! Foram meia dúzia de anos movidos pela utopia de um mundo melhor, através e com as artes contemporâneas: celebrando a diversidade e a fragilidade do amor. Fintámos o interior, oferecendo os nossos corações – era a única forma de não estarmos sós. Durante estes seis anos, recebemos mais de 300 artistas, com quem nos sentámos à mesma mesa, sob a batuta-de-pau da Vitorica. Corremos a cidade e, como se cada projeto fosse uma árvore, não nos cansámos de plantar. Por toda a parte da cidade e nos corações dos elvenses, plantámos árvores. Vindas de Cabo Verde, dos EUA, de Israel, do México, da Polónia, do Japão, de Espanha, de França, do Brasil, de Portugal (…) A cidade de Elvas terá, eventualmente, sido tomada”.

Apesar de considerar que existe um conjunto de pessoas que quer a permanência do Festival e do trabalho artístico da UMCOLETIVO em Elvas, Cátia Terrinca reconhece que a legitimidade dessa decisão cabe à autarquia.

“Quem representa a comunidade é a Câmara. Portanto, é a Câmara que deve manifestar ou não interesse num projeto. Nós estamos de portas abertas para falar sobre aquilo que o município quiser falar connosco, mas com dignidade”, adverte.

A associação UMCOLETIVO, neste momento, é constituída por quatro colaboradores:

“O João Nunes é formado em cinema e, neste caso, trabalha também como desenhador de luz; uma estagiária, Raquel Pedro e dois trabalhadores a recibo verdes, que estão muitas vezes associados à estrutura e não têm contrato que sou eu (Cátia Terrinca) e o David Costa (designer e colaborador da produção). A cada projeto movimentamos um número variável, entre as sete e as 30 pessoas, para a realização de qualquer evento”, explicou.

A ligação da UMCOLETIVO a Elvas ainda não se extingui totalmente.

“Nós vamos continuar a trabalhar na escola de Vila Boim, no Agrupamento de Escolas, uma vez que temos um apoio especifico da Gulbenkian , De La Caixa, que se chama “Art for Change”, portanto nós vamos continuar vinculados especificamente a Vila Boim, no concelho de Elvas a fazer o trabalho com a escola. No entanto, o nosso trabalho de criação e programação não passará por Elvas”.

SOBRE A UMCOLETIVO:

UMCOLETIVO é uma associação cultural, fundada em 2013,  que desenvolve atividades no âmbito da criação artística, tendo como eixos essenciais o teatro, a performance e a palavra- onde transversalmente se encontra uma ideia de reescrita, de tempo real e de voz.

​A estrutura desenvolveu uma forte relação com Elvas, local onde esteve sediada e território de implementação da maioria das atividades.

A relação com o território e com as suas características específicas – a sua condição marginal face aos grandes centros urbanos, a sua condição fronteiriça e a utilização quotidiana de duas línguas distintas: o português e o castelhano – determinaram a sua programação e refletiram a intenção de experimentar e esbater fronteiras em diferentes áreas artísticas, explorando a criação de objetos interdisciplinares.

Apresentou uma programação baseada na ideia de construção de vias de reciprocidade artística e afetiva, dentro do território e entre territórios, estruturante no desenvolvimento de uma estratégia de formação de públicos e na programação regular de três iniciativas:

Festival A Salto – Tomada Artística da Cidade de Elvas

CAL – Cinema. Ar. Livre.

ACTO – A Festa do Teatro em Elvas (com direção artística  UMCOLETIVO) 

TRANSMISSÃO – ciclo de teatro do imaginário

Das criações apresentadas destacam-se:

Tempestade (2019 – convite do CCB – Fábrica das Artes)

CARTAS (2018 – a partir das cartas de Maria Helena Vilhena a Amílcar Cabral),

Três Irmãs (2016 – prémios TIME OUT Lisboa Melhor Espetáculo e Melhor Atriz);

Escuridão Bonita (2014 – coprodução com o MOTIM – Mostra Internacional de Teatro para a Infância de Mindelo/Cabo Verde) 

Inércia (2015 – a partir do texto inédito de Fernando Pessoa).

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