Este simples roteiro das três culturas em Elvas pode servir-te como orientação para ir ao encontro dos testemunhos e memórias de muçulmanos, judeus e cristãos na cidade-quartel, constituindo-se por si mesmo como um percurso ou complementar outros passeios pelas ruas do centro histórico.
Provavelmente o local de culto mais antigo de Elvas seja a atual igreja de Sta. Maria de Alcáçova, no ponto mais alto do centro histórico. Esta é também uma das igrejas que mais alterações e descaracterizações tiveram ao longo da sua história.
Da sua origem como mesquita não restam dúvidas aos investigadores que atualmente identificam possíveis sinais dessa etapa, enquanto aguardam pela sua confirmação arqueológica que o testemunhe. Em 1241 estabelece-se na antiga mesquita a paróquia de Santa Maria, transformando o espaço para o culto cristão, com várias intervenções posteriores nos sec. XVII, XVIII e XX. No interior é difícil perceber o seu passado como templo islâmico, mas se olharmos exteriormente o pátio contíguo, que corresponderia ao “shan” destinado às abluções e onde sobrevive uma cisterna milenar é um desse testemunho ao qual se deve somar no lado oposto, e que corresponde à “qibla”, onde uma estrutura parece corresponder ao “mihrab”, isto é, o nicho que indica a direção da cidade sagrada de Meca, para onde se devem dirigir as orações.
Curiosamente a zona fundacional de Elvas, junto ao castelo vai transforma-se no sec. XIV numa nova comuna judaica, devido ao grande aumento da população sefardi que habitava Elvas e especialmente na Judiaria Velha, que está identificada em redor da atual praça da República, rua dos Sapateiros, rua João de Olivença e rua dos Açougues. É precisamente nesta rua que recentemente se identificou a que poderia ser a antiga sinagoga elvense, que a confirmar-se seria a maior existente em Portugal. Este templo judaico agora identificado, sofreu, ao igual que a mesquita, um esforço para apagar o seu testemunho, tanto espiritual como físico. Para tal foi decidido ali colocar o açougue, matadouro e local de venda de carnes, manifestando uma forma atroz e provocativa de apropriação de um local sagrado para os judeus. Foi com o edito de expulsão do reino de Portugal e a conversão compulsiva da comunidade judaíca que os sefarditas, agora cristãos-novos têm a necessidade de propagar a sua nova fé, renunciando publicamente ao judaísmo, marcando as suas casas com marcas cruciformes, que hoje constituem uma recordação física da existência dos judeus em Elvas.
Igreja de S. Pedro – Caderno by Miguel Antunes
Continuemos a descida das encostas da cidade intramuros elvense, rumando até à igreja de S. Pedro, breve exemplo dum gótico inicial e onde nas arcadas do seu portal os historiadores leem ainda algo de românico. Diante destes arcos terão passado mouros, judeus e cristão nos alvores da ocupação cristã de Elvas. Aqui perto existiu uma comuna moura que se estendia até à antiga porta de Badajoz e desde onde se tem uma vista panorâmica sobre a encosta até ao castelo.
Percorrer Elvas é encontrar memórias e testemunhos das três culturas e religiões monoteístas que durante séculos viveram dentro das muralhas. O passado dos elvenses é cristão mas também judeu e muçulmano fazendo mais rico o nosso presente multicultural enriquecido com os portugueses chegados de África ou do Brasil e todos os forâneos que salpicam a cidade de mais cor.
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