O processo indemnizatório que os Anjos moveram contra Joana Marques é não só legítimo como, no meu entender, até lógico. Bem sei o que a opinião pública tem vindo a dizer — sim, esses “especialistas” em assuntos de justiça e impactos mediáticos, cujas licenciaturas em nada têm a ver com estes dois campos.
O caso entre a banda dos irmãos Rosado e a humorista Joana Marques tem de ser analisado em três dimensões: a mediática, a judicial e a moral.
Em causa está uma alegada manipulação digital de um vídeo que Joana Marques fez da atuação da banda no evento de MotoGP, onde elementos do júri de um programa televisivo de talentos surgem com ar de reprovação, reagindo à atuação da banda que cantava o hino nacional.
Essa atuação foi marcada por erros técnicos que nada tiveram a ver com a banda. Claro que, sendo Joana Marques humorista, a publicação do vídeo como ato individual não tem, em si, grande gravidade; no entanto, a partir do momento em que a parte visada começa a ser alvo de uma extraordinária repercussão negativa amplificada pelo vídeo manipulado, o argumento da liberdade de expressão começa a perder legitimidade.
Segundo apurei através de meios de comunicação social, a banda enviou duas cartas à humorista, nas quais explica que, devido à publicação, recebe mensagens e e-mails de ódio e perde patrocínios na ordem dos cem mil euros; por isso, pediu a remoção do vídeo das redes sociais de Joana Marques.
A recusa, por parte de Joana Marques, em retirar o vídeo das suas redes sociais é, na minha opinião, um gesto de má-fé que ultrapassa a intenção de fazer humor, resvalando para a humilhação. Por questões de orgulho pessoal, manteve o vídeo mesmo sabendo o que estava a acontecer.
Sem falar no facto de uma das filhas dos Anjos estar a sofrer bullying na escola, o que, nestas idades, tem impacto emocional nos jovens.
O campo moral é, no meu entender, o que legitima todo este processo; mas não podemos olhar apenas para a moralidade, pois existem outros fatores que importa mencionar.
Muito se diz que Joana Marques é “apenas humorista” e que a sua profissão não é séria; logo, tudo o que ela faz não pode ser considerado sério. O problema é que estes argumentos não se aplicam no campo mediático.
Joana Marques tem imensos seguidores nas suas redes sociais — muito mais do que jornalistas de órgãos de comunicação social — para além do sucesso do podcast Extremamente Desagradável.
Qualquer publicação que Joana Marques faz tem enorme repercussão mediática, muito maior do que qualquer notícia de jornal ou reportagem televisiva; os efeitos não só do podcast como também dos posts nas redes sociais têm tido consequências nefastas para os protagonistas que ela escolhe para fazer humor.
Humor esse que pode ser entendido como ataques ao bom nome das pessoas, e o facto de ser popular não significa, por si só, que seja humor.
Quer no campo mediático quer no moral, os Anjos têm razão; no entanto, o que pode virar o jogo a favor da humorista é a dimensão judicial.
“Isto acaba por não fazer sentido: se eu difamar alguém, sou processado; mas, se o fizer em tom humorístico, já não sou?”


Considero-me leigo nesta matéria; a minha opinião baseia-se em comentários de juristas na televisão. Pelo que entendi, em primeiro lugar é difícil comprovar o nexo de causalidade entre o vídeo manipulado de Joana Marques e o impacto negativo na carreira dos Anjos; em segundo lugar, o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem tem dado mais valor à liberdade de expressão quando esta se enquadra como arte criativa, ato político ou ato jornalístico.
Isto acaba por não fazer sentido: se eu difamar alguém, sou processado; mas, se o fizer em tom humorístico, já não sou?
O humor é, na minha opinião, alvo de muitas interpretações subjetivas, e é difícil enquadrá-lo moralmente; contudo, não se pode justificar, em nome do humor, a humilhação pessoal, o ataque ao caráter de alguém ou a violência social contra outrem.
Não pode, nem deve, em pleno Estado de direito, alguém ser alvo de humilhações públicas sem sequer poder defender-se judicialmente.
Não, os humoristas não podem ser imunes a processos de difamação e, sim, o humor tem de ter limites.
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