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6 Agosto, 2024

(Des)construindo Preconceitos: A História de Maria Inácia

Aos 12 anos, deixou a sua terra natal para viver numa instituição em Évora (...) Maria tornou-se pioneira nas escolas de Évora. 

Maria Inácia, com 43 anos, é licenciada em Psicologia há 18 anos e Mestre em Psicologia Clínica há cinco, ambos pela Universidade de Évora. 

Natural da vila alentejana de Pias, no concelho de Serpa, a sua vida tomou um rumo distinto desde muito cedo. 

Aos seis anos, foi diagnosticada com uma doença neuromuscular. Uma condição rara e pouco compreendida há 37 anos, especialmente numa região como o Alentejo, onde o acesso a cuidados médicos especializados era limitado.

Aos dez anos, Maria já dependia de uma cadeira de rodas para se deslocar, devido à perda de força nos membros inferiores.

Para a maioria de nós, os dez anos evocam memórias de brincadeiras no recreio, corridas com amigos e saídas à noite . Agora, tentem imaginar viver essas experiências, mas numa cadeira de rodas. Essa era a realidade de Maria.

Apesar dos desafios, a infância de Maria foi também marcada por sonhos e aspirações. O medo e a insegurança eram constantes, mas a determinação em ser feliz e viver uma vida normal nunca a abandonaram. 

Aos 12 anos, deixou a sua terra natal para viver numa instituição em Évora, na procura de melhores condições para o seu desenvolvimento. A separação da família foi dolorosa, mas necessária. 

As visitas da família eram aguardadas com ansiedade e alegria, sendo sempre um fator de incentivo e força para seguir em frente.

Maria tornou-se pioneira nas escolas de Évora. 

Cada instituição que frequentou precisou de adaptar as suas infraestruturas para a acolher – desde a construção de rampas até à modificação de casas de banho. 

Estas mudanças, que hoje podem parecer óbvias, foram na altura verdadeiros marcos na inclusão.

Maria teve de lutar por elas, argumentar, convencer e, muitas vezes, esperar. Abrindo caminho para outros estudantes com deficiência.

Em 2001, ingressou na Universidade de Évora para estudar Psicologia. 

Mais uma vez, a instituição precisou de se adaptar, e mais uma vez, Maria deixou a sua marca. 

As mudanças necessárias foram implementadas, permitindo-lhe estudar em igualdade de condições com os demais. 

Em 2010, começou a trabalhar no departamento de juventude da Câmara Municipal de Évora. 

A adaptação do local de trabalho foi fundamental para que pudesse exercer o seu direito ao trabalho, demonstrando que a inclusão é uma questão de direitos, não de favores.

Maria recorda episódios de capacitismo que enfrentou ao longo da vida. 

Um dos mais marcantes aconteceu num restaurante, onde um empregado se dirigiu aos seus colegas para perguntar algo que lhe dizia respeito, ignorando-a completamente:

“A sociedade tem ideias pré-concebidas acerca de determinadas características de grupos minoritários. Estas ideias estão muito enraizadas e cabe a nós desconstruir esses preconceitos”, afirma.

Para Maria, a inclusão social das pessoas com deficiência significa permitir- lhes participar plenamente na vida social, económica e política, assegurando o respeito aos seus direitos:

 “Inclusão também é permitir que se desenvolvam e concretizem as potencialidades de cada um, bem como de se apropriarem das competências que lhes permitam exercer o seu direito de cidadania”, diz.

Desde 2019, coordena o Centro de Apoio à Vida Independente da APPACDM de Évora, um projeto que promove a autonomia e vida independente de 39 pessoas com deficiência ou incapacidade:

” Este projeto é um exemplo vivo de como a inclusão pode ser alcançada com a ajuda de assistentes pessoais, permitindo que essas pessoas participem ativamente na sociedade.”, refere.

Se pudesse voltar atrás no tempo e encontrar-se consigo mesma durante a adolescência, Maria dizia a si própria : 

“Acredita em ti mesma, sempre. Haverá dias difíceis, mas também haverá vitórias. Não deixes que a doença defina quem és. Luta pelos teus direitos e pelos teus sonhos, porque mereces ser feliz e realizar tudo aquilo que desejas.”

José Martins

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