ActualLuís BonixeOpinião
15 Janeiro, 2018

Houve taça. Não, no jornalismo desportivo nunca há taça

O jornalismo desportivo parece muitas vezes uma ementa de um restaurante de quinta categoria. É previsível. Repete-se diariamente. Não surpreende e não inova.

A Sport TV já tinha decidido que o único jogo dos quartos de final da Taça de Portugal que não iria transmitir em direto seria o Caldas-Farense. A Sport TV é uma estação de televisão paga pelos seus assinantes. Não sei, como é óbvio, quantos desses assinantes são das Caldas da Rainha ou de Faro. E muito menos sei quantos são adeptos do Caldas ou do Farense. Se houver outro Caldas-Farense (algo que pode vir a acontecer nesta época) é natural que a Sport TV não o transmita. Será um jogo do terceiro escalão do futebol português e no qual, em princípio, pouco ou nada se decidirá. Muito provavelmente, o estádio estará “às moscas” e à luz da lógica das televisões comerciais (que se compreende), as audiências serão muito reduzidas e como tal não se justificará.

Mas o jogo entre o Caldas e o Farense para os quartos de final da Taça de Portugal seria sempre diferente. E foi. O estádio estava a rebentar pelas costuras, de Faro viajaram uma dezena de autocarros com adeptos e havia o aliciante de se tratar de algo quase inédito, que era um clube de um escalão tão baixo poder ficar entre os quatro primeiros da segunda competição de futebol mais importante em Portugal.

A Sport TV achou que não deveria transmitir o jogo em direto. O mesmo acharam as rádios, incluindo a rádio pública paga pelos contribuintes (também os das Caldas da Rainha e de Faro). Mesmo que o Caldas, que venceu a eliminatória, seja uma equipa de amadores que tiram dias de férias do trabalho para poder jogar futebol. Não é uma boa “estória”?

No dia seguinte, as primeiras páginas dos jornais destacaram o óbvio e o mesmo de sempre. A vitória do Sporting que já se esperava e que não teve qualquer novidade. O melhor jogo de futebol desta eliminatória, o Rio-Ave-Aves, mereceu um discreto quadradinho nas capas dos três jornais desportivos portugueses.

O jornalismo desportivo parece muitas vezes uma ementa de um restaurante de quinta categoria. É previsível. Repete-se diariamente. Não surpreende e não inova. Nada parece demover os seus editores da mesmice do noticiário em torno dos mesmos protagonistas. Mesmo que já saibamos o que vai ser escrito. Mesmo que passe ao lado de grandes “estórias”. De “estórias” diferentes. De “estórias” interessantes.

O jornalismo desportivo opta pelo comodismo daquilo que é garantido, em vez de sair da caixa e procurar novos leitores. Mais leitores. O jornalismo desportivo vive no engano de pensar que é falando sistematicamente dos mesmos que vai conseguir eternamente vincular os seus leitores. Era assim, quando as alternativas não existiam, mas o jogo de futebol que foi quase ignorado, passou em canais alternativos porque cada vez é mais fácil ser alternativo ao jornalismo.

E haver uma alternativa ao jornalismo é o pior que se pode dizer do jornalismo.

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