ActualLuís BonixeOpinião
12 Março, 2018

Quero ser jornalista

A visão do jornalismo de boa parte da geração dos futuros jornalistas é muito mais pragmática e menos romântica.

Eu que estava ali para dizer que as principais referências do jornalismo português se chamam Adelino Gomes, Sena Santos, Joaquim Furtado entre muitos outros, sou interpelado uma e outra vez para um nome: Iryna. Estarreci.

Era eu o professor de jornalismo e aquele nome não me dizia nada. Lá me foi explicado que a Iryna, era Irina Shev. Para muitos daquela plateia, esta era uma referência do jornalismo em Portugal. Iryna Shev era a voz e a cara do Snapchat do Expresso e como tal muito popular entre um público mais jovem.

É muito interessante o modo como a geração que hoje estuda jornalismo olha para a profissão. As suas referências pouco ou nada se inspiram nos modelos anteriores, imortalizados na visão de Hollywood do jornalista “cão de guarda”, irreverente, sem horários.

A visão do jornalismo de boa parte da geração dos futuros jornalistas é muito mais pragmática e menos romântica. Dificilmente nomes como José António Cerejo, Mário Zambujal, José Pedro Castanheira ou Margarida Marante lhes dirão alguma coisa. A ideia de jornalista é inspirada na visibilidade pública da própria profissão.

Com relativa facilidade, os estudantes de jornalismo sabem quem são os principais pivots das televisões portuguesas. Quando se lançam numa aventura de tirar um curso superior de jornalismo, são muitos (tantos!) que desejam estar em frente de uma câmara de televisão, ignorando que a profissão é muito mais do que isso. Para os que hoje querem ser os jornalistas de amanhã, no jornalismo ganha-se bem e sai-se cedo!

Bem pior, é a confusão entre o que é ser jornalista e o que é desempenhar outras funções nos média. Para um jovem estudante de jornalismo, não parece haver distinção entre um apresentador e um jornalista.

Perante isto, será fácil apontar o dedo aos que aspiram vir a ser jornalistas, acusando-os de terem uma visão deturpada da profissão. Naturalmente, que há um trabalho de casa a fazer, pois os jovens (mesmo os que querem ser jornalistas) não leem jornais e não ouvem rádio, (pelo menos a rádio de informação), mas é preciso entender que os média jornalísticos têm eles próprios contribuído de modo decisivo para a construção desta visão.

A diversidade de espaços mediáticos gerou um ruído em torno da profissão de jornalista, motivando o aparecimento de formatos híbridos que veiculam conteúdos de entretenimento, estrategicamente embrulhados em modelos jornalísticos.

Por isso, o que esperar que os jovens estudantes digam, quando jornalistas mudam com rapidez de funções? Hoje apresentando notícias, amanhã lançando concursos nos programas matinais da televisão. Hoje em reportagem, amanhã tecendo comentários sobre tudo e todos em espaços de entretenimento. Hoje num relato de futebol, amanhã numa televisão de um clube.

É preciso um olho atento para detetar as fronteiras entre formatos jornalísticos e de entretenimento ou de comunicação institucional. E isso nem sempre é fácil, mesmo para aqueles que têm uma preocupação crítica sobre estas matérias. Muito menos será para quem agora se inicia no estudo do jornalismo.

 

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