Refém de um Portugal amordaçado por um regime pervertido nos desÃgnios que o edificaram. Sob a égide de uma Torre de Marfim, o Estado Novo desenhou um industrioso bordel que foi resvalando para um purgatório que encaixotava quem estava eleito a viver à tona e quem estava votado a sobreviver submerso. Soares foi um porta-estandarte do ativismo da resistência, mártir da repressão e escudeiro das forças que armadilharam o regime.
Fundador do Partido Socialista e seu Presidente honorário, foi a bússola do seu compasso ideológico, o farol das suas gerações e a autoritas que ritmava a lucidez do seu combate polÃtico.
Arquiteto do Portugal democrático, foi o pêndulo que equilibrou uma revolução que polvilhava entre fendas, fervorosa e oscilante. Numa espiral de metamorfoses, abraçou a defesa de uma Constituição que empola as garantias dos portugueses face ao arbÃtrio do poder, e que ainda hoje faz prova viva da sua elasticidade, e a criação do Serviço Nacional de Saúde. Abraçou, por sua vez, a recusa de uma democracia a ferros, inaugurando a demanda e sentenciando o desfecho do cavalo de troia da extrema-esquerda, escorraçando os intentos fratricidas da órbita democrática.
Foi Primeiro-Ministro e Presidente da República. Teve nas mãos o desfecho dos mais importantes degraus da democracia: da entrada na CEE à intervenção do FMI. Geriu-os com o inabalável pragmatismo com que cunhou a sua atividade governativa. Em todo um enredo que deixa escancarada a conclusão que Soares, a Democracia e o pulo de desenvolvimento humano que Portugal trepou nas últimas décadas são ingredientes de uma mesma fórmula.
É o expoente de uma casta de notáveis lideranças polÃticas. Não será beatificado nos termos em que Cunhal o foi, nem mitificado nos moldes de Sá-Carneiro, mais assente numa ornamentação lÃrica do que épica, e cuja vida foi tragicamente interrompida de forma precoce.
Mário Soares soma, por sinal, um volume de responsabilidades na condução dos destinos nacionais sem paralelo. Obreiro das grandes transformações, só o tempo liquidará os ressentimentos de quem à esquerda não o absolve do papel de estabilizador polÃtico, e à direita não lhe perdoa o protagonismo e o encurralamento do PPD a um esquizofrénico posicionamento no quadro polÃtico-partidário português, tendo por pano de fundo os homólogos europeus.
Ninguém resiste á erosão dos tempos. Menos Soares. O que o distingue e catapulta para a posição cimeira das figuras do regime é o de ter sido um combatente sem afim. De em toda a sua vida não se ter prostrado no ringue do combate polÃtico, sem interregnos nem refúgios. De quem se podia ter acomodado na poltrona do lugar cativo que a História lhe reservava, resguardando-se dos cobardes que na sua debilidade fizeram fartura. E é também isso que gosto em Soares: a polÃtica sem maquilhagem, o gosto pela vulcanização das massas, o brio de nunca ter encomendado palavras que não as suas, a resiliência de quem esteve na polÃtica de pé, digna e brilhantemente.
Obrigado,
Até Sempre, Camarada Mário Soares.
Eduardo Alves, Presidente da Federação Distrital de Portalegre da JS.






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